quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O ENIGMA DE VIDA!


                                                                                         

                                                                                                                                     
               A tradição africana, o essêncial é fazer filhos, como educá-los só Deus sabe. Foi essa filôsofia que os meus progenitores optaram, eles tiveram 10 filhos incluíndo a mim. Nem todos sobreviveram, tendo restado apenas 4 dentre esses sou eu. Mesmo assim, os pais querem ver filhos casados e ter filhos a qualquer preço, e eu o mais velho fui vítima.
                 Andava tão bem trabalhando e aumentando os meus conhecimentos, na cidade da Beira, entretanto em gozo de férias na terra natal, deparo-me com o inesperado, nada mais, nada menos que uma moça a minha espera em casa dos velhos. O cenário foi embaraçoso.  Confesso que essa união não teve sucessos desejados, um pouco mais de um ano houve uma roptura.
                Nesse enlance tive a minha primeira filha, a Inês. O fim desse cenário, não agradou aos meus pais nem os demais familiares, apenas a mim. Que eles não entendia que a escolha seria minha e não deles. Por isso deu no que se deu! Foi muito triste para mim ter que viver uma vida programada pelos progenitores. Pelo menos, neste caso não deviam! Devo dizer que o pai gera o filho e nunca pode gerar a consciência desse filho, a consciência é uma espécie de um fenótipo, portanto a genêtica, acho eu, não ser responsável pelo o ser de um ser.
               Tendo sido infeliz a primeira união, por conta própria descobre-se uma fulana de muita tenra idade ainda, portanto uma estudante frequentando o último ano do primário. Como seria o processo, com uma menor, para ser sinceiro, não se pretendia logo uma união, por outro sim, acompanhar a evolução da moça se bem que os pais não reuniam condições eficazes para um acompanhamento na miúda. Portanto, o meu papel que definira para moça seria uma espécie financiador e acompanhante, ficou assim acordado, nada de ingerência ainda na miúda.
                    O senhor Salvador Nawere, conforme o nome, esse senhor era filho do régulo Nawere da zona Chimwara, muito próximo da actual ponte Armando Emilio Guebuza, precisamente naquelas bandas nasceu esse senhor , o pai da menina Teresinha Salvador. A intênção era colocar essa linda menina a um nível aceitável, e tudo pudesse ser concretizado na melhor forma possível. Com os pais o acordo foi exactamente esse.
                    Antes de um ano sou confrontado com uma informação de doença grave do pai da minha amiguinha, tive que desempenhar papel de filho para este velho sem parentes responsáveis. Fui acompanhar o velho ao hospital do Malawi, tendo ficado lá com a esposa internado.
                    Algumas semanas depois, a mulher volta sem marido, para anunciar a morte deste. Isso veio a complicar a vida da pequena Teresinha, se bem que decidiram tirar a moça da escola e leva-la para terra natal dos pais. E eu fiquei sem esperar por ela, por que não imaginava o que poderia acontecer com esta moça, com os tios mal esclarecidos. Esta moça vai ser infeliz. Pensei!
                     Decorido um ano e seis meses, os tios entendem trazer a moça para Beira e resolvem me entregar pura e simplesmente. Dizendo que não podia continuar a viver com a pequena e tivera instruções do falecido irmão para entregar ao namorado, nesse caso eu. Que poderia fazer, perante uma situação destas? Como a miuda vivia com os pais na zona urbana, tive que arranjar uma flat na zona dos Pioneiros, tudo foi a queima roupa, dois meses depois fui desalojado pela APIE, alegando contradição na atribuição daquela flat. Mau grado!Tive que me hospedar provisoriamente em casa da minha prima, na Manga-Mobeira, durante alguns meses.
                     Trabalhava nessa altura na fábrica de confecções Irmãos Unidos do Grupo Morreira & Silva, os patrões eram muçulumanos, aos quais lhes devo muitos favores. Os tais me converteram ao Isslamismo, fui tratado como uma pessoa da familia e apoiaram-me bastante na minha formação acadêmica. foram quase três anos nesta empresa e  nos fins de 1977  concorrí para  os Caminhos de Ferro, tendo sido aprovado, para um lugar de Factor de Trâfego. No curso de formação fiquei classificado em segundo lugar, tendo direito a escolha à uma estação.
                       Pronto para partir para estação de Manica na linha de Machipanda, a Direcção dos caminhos de ferro recebe uma notificação do Partido Frelimo que solicitava a minha presença na sede Provincial. O Partido tinha informações de que eu andava durante o curso com livro de cheques da Organização da Juventude Moçambicana, na qual eu era membro do conselho coordenador distrital e chefe do Departamento de Mobilização e Organização da Terceira Localidade (Munhava Central).
                        Ora bem, como se deu esse caso? Durante a formação levei comigo todos os documentos que me eram confiados incluindo cheques da Organização, como o número dois daquele escalão.Um colega do curso insatisfeito pela minha classificação, achou que informando ao Partido caso tivesse tais documentos ilegalmente, perderia o lugar nos C.F.M.. Tudo ficou esclarecido e eu devia manter e guardar os documentos, atê a transferência legal para o outro membro se fosse o caso. O partido explicou por escrito aos C.F.M. e retomei as minhas funções. E o tal colega ficou envergonhado. E  atê hoje sou amigo do senhor Chocolate!...
             Perante esse transtorno perdí a oportunidade de ir para Estação de Manica. Fiquei provisoriamente nas manobras, procedendo a distribuição do material circulante e a respectiva recolha do material circulante ao porto da Beira. Para esta àrea foi um ganho em termos de estágio, nada ficou perdido graças a Deus!
              Em 1979 fiquei transferido para a linha da Ex-T.Z.R ( Trans-Zambeze- Raylway), mas concretamente na Estação de Dona Ana na Vila de Mutarara. Para onde levei a Teresinha já com um bebé de seis de meses mais ou menos. Em 1980 no mês de Junho fui chamado para Serviço Militar Obrigatório, tendo deixado a moça em casa de meus pais. De férias, em 1981 a Teresinha teve a segunda grávida, tendo o segundo bebé no ano seguinte. Em 1982 a menina perdeu a cabeça, pensando que eu não voltaria mais por causa da guerra intênsa, nas matas da Provincia de Gaza, para onde eu estivera em mil novecentos oitenta e dois ( 2ª Brigada da Infantaria Motorizada), a minha coleguinha ficou enganada pelos outros e perdeu-me para sempre. Mas tarde tive a informação do falecimentos dos meus filhos ( Albano e Manuel). FIM.
               
                                                                      A MORENINHA  
               Um pouco preparado para vida, o ciclo preparatório concluido e já a trabalhar como funcionário de estado nos C.F.M, na vila de Mutarara, minha terra natal. Apercebí-me de uma moça calma, tranquila,amável e respeitosa. Aquí havia tombado o meu coração e não resistí, o meu eu tomou conta de mim. Fiz os meus contactos para a menina, Nazaré da Costa Nobre, ainda a frequentar o ensino secundário, entretanto, ela não se fez de rogada, correspondeu-me positivamente. Isso foi graças a ela, que havia uma corrente que não era favorável, por várias razões sócio-culturais. E a minha esposa não foi preconceituosa. Não ligou a minha raça e nem a minha origem. Por isso ela merece uma estátua!
               Tivemos relativamente uma vida feliz que deixou muita saudade!...
                Contraímos o matrimónio em 1982 no Cartório em Mutarara Nova perante o senhor Conservador distrital, Amone.E Nikah na mesquita de Bâwe em Mutarara. Foi mãe muito humana e uma madrasta muito adorada da minha primeira filha, na qual cuidou com muito carinho e dedicação. Por essa razão a minha filha Inês deve a ela muitos favores, digamos, favor de um mãe.
               Foram quase quatro anos juntos na vila de Mutarara, numa vida sem igual, em termos de harmonia conjugal. Mau grado! Foi a guerra dos dezasseis anos que nos atingiu alí, num dia em plena madruga, que fugimos as correrias, em direcção a República do Malawi, entretanto, um país vizinho que nos acolheu como pode na altura. A nossa permanência no país vizinho foi de poucos dias, eu e minha moreninha, rumanos à Tete.
               Não é porque em Tete não havia guerra,entretanto oferecia segurança aos populares, atráves das forças do governo. Também a nossa opção de sair de imediato do Centro de Refugiados do Malawi, tinha a ver com a situação profissional. Pois, aquí se conseguiria um  enquadramento nos  Caminhos de Ferro de Tete. Nessa altura tínhamos a Inês e dois filhinhos de ambos. Foi apenas o enquadramento em Moatize, portanto, sem direito ao alojamento. Se a empresa o fizesse para mim, seria então para todos e não havia cobertura para tal.
                 Como havia dito, a situação de alojamento foi deveras preocupante, tivemos  que nos hospedarmos em casa do meu grande irmão, Eduardo Gonçalo da Costa Xavier, que foi tão generoso para comigo e a minha familia. Nesta casa encontramos outros abrigados, perfazendo connosco mais ou menos vinte e cinco elementos, na mesma casa de apenas três quatos e uma sala de estar. Foi generoso esse homem, hei!...
                  Minha colega em plena gestação nos meados de 1987, tivemos que aranjar uma casa de arrendamento algures na cidade de Tete. Nessa casa depois de construirmos uma latrina melhorada com apoio dos C.F.M., entretanto, a dona de casa decidiu-nos desalojar. Conseguimos uma garragem depois desta, na zona da GPZ onde vivemos sensívelmente quatro meses. Se bem que nessa altura o governo de Tete , liderado pelo falecido governador Eduardo Arão, decidiu enviar alguns trabalhadores para Linha , digamos, troço de Dona Ana (Mutarara) e Vila Nova da Fronteira. Para fazer circular o comboio de Mutarara ao vizinho Malawi, para abastecer as populações deslocadas em Mutarara, provenientes dos distritos de Chemba, Caia, Inhaminga, Marringué e Morrumbala. Só podemos ver o impacto desse programa! Entretanto fui indicado para Chefiar a Estação da sede da Vila de Mutarara(Dona Ana), foi uma grande oportunidade para mim e aproveitei exigir uma casa dos C.F.M em Moatize, como condição para regressar para zona de guerra. Queria deixar a minha familia bem alojada e assim aconteceu.
                                           
              A familia bem alojada em Moatize e eu na zona de guerra. Minha esposa sempre dava-me moral e impulso para cumprir as ordens superiores, uma forma de ganhar prestígio no seio dos mandantes. Tive orgulho de ser o primeiro funcionário a pisar a zona em guerra e já em poder das tropas governamentais. A primeira missão que recebí do então senhor Representante dos C.f.M. em Tete, Quisito Joaquim Tesoura, Foi de verificar os estragos de bens dos C.F.M.; nomeadamente: Estações de Sena, Dona Ana, Mutarara Velha e Vila Nova de Fronteira. Portanto verfiquei e reportei o estado das coisas ao senhor Representante. Cumprí essa missão com ajuda das Forças de Defesa, Porque estávamos em plena guerra dos dezasseis anos.
              Devo recordar que essa missão envolveu muitos profissionais dos caminhos de ferro, entre os maquinistas, capatazes de via, revisores do material circulante, factores de tráfego e condutores. Portanto, o maior número de funcionários, teve que fixar-se na estação de Vila Nova De Fronteira, onde funcionaria um mini-comando desse tráfego, eu fiquei na sede Mutarara com um factor e um capataz de via e diversos trabalhadores, que as tropas a medida que iam recuperando as populações, traziam-nos alguns trabalhadores libertados. Portanto, aquí também funcionámos como uma triagem de trabalhadores libertados. Quem conseguisse transporte para Beira, era-lhe passada uma guia por nós, de forma que pudesse se apresentar às estruturas dos caminhos de ferro na cidade, e os outros optavam pela cidade de Moatize em Tete e o procedimento era igual.
                 Mas também precisávamos alguns trabalhadores em Mutarara, para o cumprimento do programa que me referí anteriormente. Devo dizer que a permanência em Mutarara dos trabalhadores libertados não era obrigatória, apesar de serem necessários alguns para trabalhos emergentes. Os salários eram garantidos pela Direcção Executiva da Beira, mensalmente enviando avionetas com pagadores atê a Vila de Mutarara.
                  Porém, enquanto estávamos preparando  o troço de linha Mutarara-Vila Nova, para fazer circular  pela linha fêrrea, produtos de primeira necessidade do Vizinho Malawi, para abastecer as populações em Mutarara, que não paravam de chegar das matas, recebo notícias do senhor comandante que veio a minha casa com o senhor Administrados Massingue, dizendo que a Estação de outro extremo ( VNF) tinha sido atacada naquela madrugada e que os funcionários dos caminhos de ferro mais de vinte haviam sido bárbaramente assassinados, incluíndo o meu amigo Chico Melo o então chefe de estação.
                    O senhor Administrador Francisco Massingue, ordenou-me que eu fosse a Tete informar do sucedido a Empresa C.F.M., devo dizer que esta tarefa não foi fácil. Primeiro não havia comunicação para e de, ficávamos isolados em termos de comunicação, não havia celulares como hoje em dia, por tanto tive que ir a Tete informar com detalhes. Tive que apanhar um ANTANOV que seguia para Chimoio,e de Chimoio para Tete viajei numa coluna militar, por causa de emboscadas a viagem  durou uma semana e alguns dias. É verdade! Tivemos que remover troncos que esbarravam a estrada ou tapar grandes valas que obstruía a via...
                   Cheguei em Moatize quando eram dez de manhã, levei cinco minutos, a minha casa estava inundada de pessoas curiosas, especialmente esposas daqueles que foram assassinados em Vila Nova de Fronteira. Todos queria saber a verdade, para mim, era segredo divulgar a eles, quem morreu quem não morreu, era segredo de Estado naquela altura. Como eu não estivesse exatamente em Vilanova de Fronteira, conseguí esquivar as pessoas, dizendo que somente trouxera o expediente do distrito de Mutarara para as estruturas provinciais, que as pessoas deviam aguardar pela informação de estruturas competentes. Não conseguí convencer as pessoas, mas tinha que ser assim mesmo. (continua)
                     
                

1 comentário:

  1. Sempre que voltamos ao passado algo fica sempre por dizer. Agradeço quem possa articular comigo nestas passagens, e se julgar conhecer alguns factos aquí relatados.Fica desde já o meu convite!

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